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A química nos testes rápidos para COVID-19


O isolamento social tem sido o recurso chave para conter o avanço das infecções por COVID-19 em todo mundo e permitir que haja atendimento para as pessoas ao evitar que o sistema de saúde colapse. Outra medida importante é a testagem em massa que proporciona dados para avaliar a situação epidemiológica e analisar quando e como proceder a reabertura econômica de uma região.

Diante desse contexto, foram criados diversos testes com princípios diferentes, mas todos capazes de identificar se um indivíduo esteve ou está infectado com o vírus. Dentre estes há as sorologias imunoensaio enzimático (ELISA) que se baseia numa reação enzimática, imunoensaio quimioluminescente e o teste de Reação em Cadeia da Polimerase com Transcrição Reversa em tempo real (RT-PCR) que é capaz de detectar o material genético do Sars-Cov-2 entre outros. Contudo, o que será abordado nesse texto serão os testes rápidos ou sorológicos que usam sangue total, soro ou plasma. Esses são de fácil execução e conseguem dar resultados entre 10 a 30 minutos pois usam o método chamado de Imunocromatografia, que é a geração de cor a partir de uma reação química entre antígeno e anticorpo. Os resultados são chamados de IgM e IgG.

Esses resultados são capazes de dizer se a pessoa não está infectada, já foi exposta e está na fase ativa da doença havendo possibilidade do micro-organismo estar circulando no paciente, ou até mesmo indicar que pessoa está na fase crônica e /ou convalescente ou já teve contato com a doença em algum momento na vida. Isso é possível pois IgM (Imunoglobulina M) são as primeiras defesas do corpo e a IgG (Imunoglobulina G) são as defesas que além de agir em conjunto com as IgM, “memorizam” o antígeno e permanecem no sangue por mais tempo (Figura 1).

Contudo é importante frisar que o teste deve ser feito entre 3 a 7 dia após a pessoa demonstrar sintomas, que é o tempo que o corpo leva para produzir esses anticorpos, assim gerando mais condições para detectar a presença das imunoglobulinas específicas para o vírus. Além disso, de acordo com o Ministério da Saúde, a chance de erro em resultados negativos para o novo coronavírus é de 75%, ou seja, uma baixa confiabilidade. E por isso, sua função é de controle epidemiológico e não necessariamente como diagnóstico da doença.

Figura 1 – Gráfico apresentando a resposta imunológica da Sars-Cov-2

Fonte: Labtest

Fonte: Labtest

Para entender como a química é usada para elaboração do teste, é importante primeiro compreender os conceitos por detrás da reação entre o antígeno e anticorpo. Já que o sistema se baseia em como essas moléculas se comportam.

A interação antígeno-anticorpo

Ocorre através de uma associação biomolecular semelhante à interação de enzimas com seus substratos com a diferença que o anticorpo não provoca nenhuma alteração química irreversível na molécula de antígeno, ou seja, o produto (Antíg-Antic) pode dissociar em Antíg e Antic livres em solução.

A associação acontece pois os antígenos possuem estruturas químicas que favorecem a complementariedade com o anticorpo, chamadas de epítopos (Figura 2), por meio de Forças intermoleculares como Forças eletroestáticas, Pontes de hidrogênio, Forças de van der Waals ou Forças hidrofóbicas. Essas ligações podem ser rompidas por altas concentrações de sal, detergentes, pH extremo e, algumas vezes, por competição com altas concentrações do próprio epítopo puro.

Algumas características da interação Antíg-Antic:

• Afinidade que é a força resultante entre as interações entre um único sítio do anticorpo e um único epítopo do antígeno que depende do grau de complementariedade entre as moléculas. Quanto maior a afinidade, mais fortes e duradouras são as ligações.

• Avidez que é a força resultante de múltiplas entre uma molécula de anticorpo e os epítopos de um antígeno complexo. Quanto maior a avidez, melhor o efeito biológico final o que pode compensar uma baixa afinidade.

• Especificidade que é a habilidade do anticorpo em distinguir seu antígeno de outros, pode ser entendido pelo conceito de chave e fechadura também usada em enzimas e substratos.

• Reatividade cruzada no caso de vários vírus (assim como a Sars-Cov-2) e bactérias possuem determinantes antigênicos ou similares a componentes da célula hospedeira. A presença desses micróbios estimula anticorpos que reagem de maneira cruzada com os componentes da célula hospedeira o que resulta em uma reação autoimune que lesiona o tecido.

Figura 2 – Interação anticorpo e epítopo do antígeno

Fonte: faculdade de agrária e veterinária da UNESP

Fonte: faculdade de agrária e veterinária da UNESP

Entendendo o teste

O sistema possui três marcações: Controle, IgG e IgM. Quando a pessoa testada possui Imunoglobulinas G e/ou M contra o antígeno, o resultado apresentará cor para cada molécula presente. O teste apenas será válido se o grupo controle também formar uma linha colorida, independente de dar positivo ou negativo, pois isso indica que houve erro no procedimento ou deterioração do sistema (Figura 3).

Figura 3 – Interpretação dos resultados

Fonte: Centerlab

Fonte: Centerlab

O princípio envolvido consiste em anticorpos anti-IgG e anti-IgM humano, ou seja, moléculas capazes de interagir com as imunoglobulinas G e M, imobilizados por uma membrana de nitrocelulose nas regiões IgG e IgM, respectivamente (Figura 4). Já o reagente controle apresenta IgG de cabra anti-camundongos. Na placa de reação (o aparelho do teste) há uma área chamada de conjugado onde está presente partículas de ouro coloidal, nanopartículas de ouro suspensa em solução com água, ligadas aos antígenos recombinantes do COVID-19. Para que o teste funcione, além do sangue, soro ou plasma, é necessária uma solução tampão que contém fosfato, cloreto de sódio, polipeptídeo de alto peso molecular e ProClin 300. Após adição da amostra, o conjugado se complexa com os anticorpos contra COVID-19 (caso a pessoa tenha se infectado com a Sars-Cov-2) e ao pôr o tampão, o complexo anticorpo-conjugado migra cromatograficamente através da membrana e encontra a região teste.

Figura 4 – Esquema da interação da amostra com as anti-imoglobulinas

Fonte: Labtest

Fonte: Labtest

Em suma, por mais que o nome seja testes rápidos e expresse algo simples, todo o conhecimento em sua elaboração é diverso e complexo. Em vista disso, a química é fundamental no combate a COVID-19, para além da prevenção. No álcool em gel, nos produtos de limpeza, no tecido da máscara, nas vitaminas que ingerimos, na pesquisa de medicamentos e até no princípio dos testes.

Bibliografia:

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Labtest. Anti COVID-19 IgG/IgM Rapid Test. Disponível em: https://www.centerlab.com/fileuploader/download/download/?d=1&file=custom%2Fupload%2FFile-1585575746.pdf. Acesso em: 13 de junho de 2020.

Labtest. Labtest lança teste rápido para COVID-19. Disponível em: https://labtest.com.br/labtest-lanca-teste-rapido-para-covid-19/. Acesso em: 13 de junho de 2020.

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