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Entendendo o prêmio Nobel de Química 2017


 Foram anunciados pela academia real de ciências da Suécia, em Copenhague, Dinamarca, os ganhadores do prémio Nobel de Química 2017. Os cientistas Jacques Dubochet, Joachim Frank e Richard Henderson ganharam o prêmio por desenvolverem a cryo-electron microscopy (Criomicroscopia eletrônica), que determina estruturas tridimensionais de alta resolução de biomoléculas em soluções. Esse método levou a um grande avanço da bioquímica e ao entendimento básico da vida, além de contribuir para desenvolvimento de medicamentos e conceitos dentro da medicina e biomedicina. [1]

Figura 1: Caricaturas dos ganhadores do prémio Nobel de Química 2017: Jacques Dubochet, Joachim Frank e Richard Henderson. [2]

Figura 1: Caricaturas dos ganhadores do prémio Nobel de Química 2017: Jacques Dubochet, Joachim Frank e Richard Henderson. [2]

 O trabalho laureado com o prêmio vem de uma pesquisa de muitos anos, para ser mais especifico, da década 70, quando Richard Henderson se propôs em determinar a estrutura de proteínas ativas. A principio, ele utilizou a difração de raios-X e a Ressonância Magnética Nuclear (RMN), no entanto as duas tecnologias apresentavam limitações quando aplicadas ao objetivo dele. A difração de raios-X exige que as moléculas formem cristais bem organizados, como os cristais de gelo, ou que os materiais sejam sólidos, sendo que essa forma rígida revela muito pouco sobre a dinâmica da proteína, e o RMN, apesar de conseguir determinar moléculas orgânicas em solução, não consegue fazer o mesmo para biomoléculas. Tais limitações fizeram com que o Henderson apostasse na Microscopia Eletrônica (ME), que funciona mais ou menos como microscopia comum, mas tendo um feixe de elétrons sendo enviado através da amostra, ao invés de luz. O comprimento de onda dos elétrons é muito mais curto do que o da luz, então o microscópio eletrônico pode tornar visíveis estruturas muito pequenas, até mesmo posições de átomos individuais. Em teoria, a resolução do microscópio teria sido mais do que suficiente para Henderson obter a estrutura molecular de uma proteína de membrana, mas na prática o projeto era quase impossível. [1]

 Quando o microscópio eletrônico foi inventado, na década de 1930, os cientistas achavam que ele era adequado, apenas, para estudar matéria morta. O intenso feixe de elétrons, necessário para a obtenção de imagens de alta resolução, incinera o material biológico e, se o feixe for enfraquecido, a imagem perde seu contraste. Além disso, o microscópio eletrônico requer um vácuo no sistema, condição na qual as biomoléculas se deterioram, já que a água ao redor do material evapora. Quando as biomoléculas secam, elas colapsam e perdem sua estrutura natural, tornando as imagens inúteis. [1]

 Mesmo com essas limitações Henderson não desistiu, e resolveu continuar apostando na ME. Utilizando uma proteína chamada Bacteriorrodopsina, que é encontrada na membrana de organismos fotossintetizantes, ele aplicou ME na própria membrana com a proteína, evitando assim a perda estrutural dessa. Além disso, usando uma solução de glicose sobre a membrana, evitando assim a desidratação da proteína, e sobrepondo as imagens obtidas, ele conseguiu obter a estrutura tridimensional dessa proteína (Figura 1), no entanto isso só foi possível, pois esta se embala de forma natural e regular na membrana. Poucas outras proteínas configuram-se espontaneamente dessa maneira. A questão era se o método poderia ser generalizado, isto é, se seria possível usar um microscópio eletrônicas para gerar imagens de alta resolução, em 3D(tridimensional), de proteínas, que foram espalhadas aleatoriamente na amostra e orientadas em direções diferentes. [1]

Figura 2: Estrutura Tridimensional da Bactetiorrodopsina. [1]

Figura 2: Estrutura Tridimensional da Bactetiorrodopsina. [1]

 Outro laureado com o prêmio, Joachim Frank, conseguiu responder essa questão olhando de um ponto de vista computacional. Utilizando novamente o ME, ele obteve imagens 2D (bidimensionais) com baixa resolução de um ribossomo em uma forma aleatória. Unindo essas imagens em um algoritmo ,que ele e sua equipe desenvolveram, foi possível obter uma imagem 3D de alta resolução da proteína. [1]

Figura 3: Esquema do processo e do desenvolvimento da analise computacional de Frank. [1]

Figura 3: Esquema do processo e do desenvolvimento da analise computacional de Frank. [1]

 Embora, no trabalho de Henderson com a proteína Bacteriorrodopsina, a utilização da solução da Glicose para evitar a desidratação tenha dado certo, em outros sistemas essa estratégia não seria possível. No entanto, Jackes Debuchet conseguiu resolver esse problema: a princípio, ele pensou em evitar a perda de água congelando o sistema, mas os cristais de gelo interferiam na passagem dos feixes de elétrons, o que tornava o processo inviável. Após isto, ele utilizou o método de vitrificarão, que consiste em congelar a água de forma rápida, com etano líquido na temperatura de -190°C, criando um estado amorfo da água que possibilitava a passagem do feixe de elétrons. Para testar a eficiência do seu método, ele o aplicou na obtenção de estrutura cristalina de um vírus, na qual obteve êxito. [1]

 Juntando a contribuições de todos esses pesquisadores, foi possível a construção desta tecnologia que contribui de diversas formas para ciência, seja na bioquímica, na medicina, ou até mesmo na biomedicina. Um fato que marca essa contribuição foi aplicação da Crio-ME na determinação da estrutura tridimensional do vírus da ZIKA. Durante o surto que ocorreu recentemente dessa Doença, que estava causando a microcefalia nos bebês recém-nascidos, foi possível, com essa determinação tridimensional, conhecer o mecanismo de ação do vírus e o começo da busca de uma vacina. [1]

Figura 4: Estrutura tridimensional do Vírus da ZIKA. [1]

Figura 4: Estrutura tridimensional do Vírus da ZIKA. [1]

Leia mais em: https://www.nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/2017/popular-chemistryprize2017.pdf

[1] POPULAR SCIENCE BACKGROUND, They captured life in atomic detail; Disponível em: https://www.nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/2017/popular-chemistryprize2017.pdf,; Acesso:15/10/2017

[2] Nobel Media. Ill. N. Elmehed, The Nobel Prize in Chemistry 2017; Disponível em: https://www.nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/2017/ ,; Acesso: 15/10/2017