Japanese Special Naval Landing Forces with gas masks and rubber gloves during a chemical attack, Battle of Shanghai, 1937

Início do uso de Armas Químicas em larga escala e seus efeitos no organismo


Arma química é qualquer substância tóxica, usada intencionalmente, que causa morte ou lesões permanentes em humanos ou animais, sendo classificada como armas de destruição em massa. Embora tenham-se registros de seu uso durante a Antiguidade, ela só foi amplamente empregada na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), devido ao avanço industrial químico alemã no século XX.

Nesse contexto, enquanto o recém desenvolvimento, em 1908, do processo de síntese do gás amônia (Figura 1), pelo químico alemão Fritz Haber, que auxiliava a agricultura adquiria uma função bélica para fabricar o precursor da pólvora, o nitrato de amônio (Figura 2), houve o início do uso de gases tóxicos.

 

Figura 1: Reação de Haber Bosch – síntese da amônia a partir do nitrogênio e hidrogênio gasosos.

Figura 1: Reação de Haber Bosch – síntese da amônia a partir do nitrogênio e hidrogênio gasosos.

Figura 2: Reação entre amônia e ácido nítrico, formando o nitrato de amônio.

Figura 2: Reação entre amônia e ácido nítrico, formando o nitrato de amônio.

O primeiro ataque com agente químico, conduzido por Haber, foi com 180t de gás cloro, , usado pelos alemães, em 1915, contra a cidade de Ypres, na Bélgica, causando 15 mil vítimas. É um gás amarelo-esverdeado e com odor sufocante, que causa asfixia, edema pulmonar, bolhas na pele, lacrimejamento etc. Meses depois, nessa mesma cidade, foi usado o gás fosgênio – dicloreto de carbonila, , um derivado de formaldeído (Figura 3). Esse, por sua vez, é incolor e com cheiro de milho verde, cujo órgão-alvo também é o pulmão, levando à expectoração espumosa, dispneia, cianose, irritação nos olhos etc.

Figura 3: Estrutura molecular do gás fosgênio.

Figura 3: Estrutura molecular do gás fosgênio.

Em 1917, houve a adesão do gás mostarda – bis(2-cloroetil)tioéter, , que é formado a partir do eteno e do dicloreto de enxofre (Figura 4). É um líquido volátil amarelo claro, oleoso e de odor doce de alho, evaporando num gás venenoso. Por ser uma substância vesicante, causa, em contato com a pele e a mucosa, irritação e bolhas na derme, sendo corrosiva aos olhos, à pele e aos pulmões, cuja exposição leva à cegueira e à hemorragia nasal. A partir desses efeitos, houve a necessidade de se usar roupas impermeáveis. Embora o gás mostarda tenha sido usado para o mal, foi também durante a Segunda Guerra, em um incidente conhecido como “Efeito Janus”, que se deu incício ao desenvolvimento da Quimioterapia, tratamento do câncer através de substâncias químicas, como a leucemia, a qual é ainda hoje tratada com o remédio mecloroetamina, relacionada ao agente mostarda.

 

Figura 4: Reação de produção do gás mostarda através do eteno e dicloreto de enxofre.

Figura 4: Reação de produção do gás mostarda através do eteno e dicloreto de enxofre.

No entanto, houve retaliação por parte dos franceses com o cianeto de hidrogênio, , que causa asfixia, pois, ao ser inalado, o cianeto se une à hemoglobina do sangue, impossibilitando que ela transporte o oxigênio para as células do corpo.

É estimado que o uso de substâncias tóxicas causou 1,3 milhão de vítimas e 100 mil baixas no fim da Primeira Guerra. Dado esse efeito irreparável, foi firmado por alguns países o Protocolo de Genebra, em 1925, que proibia o uso dessas armas, mas não abordava o armazenamento delas. Embora limitado, foi um marco na história, não sendo relatado seu uso proposital durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), apesar de ser a época em que ocorreu o desenvolvimento de outros agentes. Esses, os gases neurotóxicos, era uma recém classe de substâncias químicas produzidas pelo químico alemão Gerhard Schrader enquanto estava trabalhando com pesticidas. A toxicidade desses é ainda maior do que as anteriores.

Tais gases são organofosforados, isto é, formados por ligações de Carbono e Enxofre, dentre eles têm-se: tabun, sarin e soman (Figura 5). Eles atuam na inibição da acetilcolinesterase, uma enzima que controla os movimentos musculares ao hidrolisar o neurotransmissor acetilcolina, em colina e ácido acético, após ela transmitir impulsos elétricos entre os neurônios e junções musculares. Assim, quando esses gases neurotóxicos são inalados ou absorvidos pela pele, essa enzima tem sua produção impedida, fazendo com que os músculos do corpo sejam superestimulados e, por consequência, ocorra convulsões, arritmia cardíaca, fraqueza e depressão respiratória, levando, assim, à morte.

Figura 5: Estrutura molecular do o-etil-N,N-dimetil-fosforamido-cianidato (tabun),  o-isopropil-metil-fosfono-fluoridato (sarin) e o-pinacolil-metil-fosfono-fluoridato (soman), respectivamente.

Figura 5: Estrutura molecular do o-etil-N,N-dimetil-fosforamido-cianidato (tabun), o-isopropil-metil-fosfono-fluoridato (sarin) e o-pinacolil-metil-fosfono-fluoridato (soman), respectivamente.

Portanto, embora atualmente esteja em vigor a Convenção de Proibição de Armas Químicas (CPAQ), assinada em 1993 em Paris, que impede produção, uso, desenvolvimento e armazenamento desses agentes, continuam sendo uma ameaça à população mundial devido, principalmente, aos casos de terrorismo que as usam.

 

Referências

 

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DOMINGOS, Josiel B. et al. A química dos ésteres de fosfato. Química Nova, v. 26, n. 5, p. 745-753, 2003.

REIS, Martha. Completamente química. São Paulo: FTD, 2001. 3 v.

MORAIS, Pâmela. Armas químicas: por que são proibidas?. Politilize!,2018. Disponível em: https://www.politize.com.br/armas-quimicas-por-que-sao-proibidas/. Acesso em: 11 fev. 21.

National Center for Biotechnology Information. “PubChem Compound Summary for CID 10461, Mustard gas” PubChem. Disponível em: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Mustard-gas. Acesso em: 11 fev. 21.

National Center for Biotechnology Information. “PubChem Compound Summary for CID 7871, Sarin” PubChem. Disponível em: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Sarin. Acesso em: 11 fev. 21.

National Center for Biotechnology Information. “PubChem Compound Summary for CID 6371, Phosgene” PubChem. Disponível em: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Phosgene. Acesso em: 11 fev. 21.

National Center for Biotechnology Information. “PubChem Compound Summary for CID 24526, Chlorine” PubChem. Disponível em: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Chlorine. Acesso em: 11 fev. 21.

National Center for Biotechnology Information. “PubChem Compound Summary for CID 22985, Ammonium nitrate” PubChem. Disponível em: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Ammonium-nitrate. Acesso em: 11 fev. 21.

National Center for Biotechnology Information. “PubChem Compound Summary for CID 768, Hydrogen cyanide” PubChem. Disponível em: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Hydrogen-cyanide. Acesso em: 11 fev. 21.

QUÍMICA DA MORTE | Efeito Janus. A Graça da Química. Disponível em: https://agracadaquimica.com.br/efeito-janus/#:~:text=Em%20concentrações%20altas%20pode%20provocar,bem%20e%20o%20do%20mal. Acesso em: 15 fev. 21.