Nota do editor: Texto escrito em janeiro de 2017.
“Ganância demais, fome demais, falta demais, promessa demais, seca demais, chuva não tem mais!” (O Rappa – Súplica Cearense)
De acordo com a conjuntura atual, nunca uma música descreveu tão bem a situação do povo cearense. Em muitos jornais e web sites regionais são encontradas as manchetes:
“Seca de 2016 no Ceará está entre as piores da história” (Diário do Nordeste);
“CE tem 73% do território em estado de seca extrema ou excepcional” (EBC Agência Brasil);
“Maior seca dos últimos 100 anos provoca mudanças no uso da água no Ceará” (G1 Ceará).
A seca é um problema recorrente no Ceará, sendo um fenômeno característico da região, não podendo ser vencido. Com o avanço da desertificação e o aumento da temperatura média da Terra, as regiões semiáridas enfrentam desafios diários na luta pelo abastecimento de água. Segundo um levantamento feito pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), com base nos volumes de chuva dos últimos 100 anos, desde 1910 o Ceará não passava por uma seca tão severa como a dos últimos cinco anos. Antes desse período de estiagem, somente a seca de 1979 a 1983 havia sido tão grave e longa. Devido ao baixo índice pluviométrico os açudes operam com volume muito menor do que a capacidade.
De acordo com o presidente da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará (Cogerh), em consequência das baixas precipitações e altas perdas por evaporação, o volume dos reservatórios foram caindo a cada ano, sendo que dos 153 açudes monitorados, 42 estão com volume morto e 38 estão completamente sem água. Dos sete responsáveis pelo abastecimento da região metropolitana, os três maiores, Castanhão, Orós e Banabuiú, operam com o volume útil de 8,8%, 21% e 0,58%, respectivamente.
O estado de seca ao qual o estado tem passado faz com que passemos por várias dificuldades econômico-sociais, tendo perda total de culturas e pastagens, sumiço de pequenos cursos de água, danos a várias comunidades uma vez que o abastecimento de água muitas vezes quando não é limitado, não há.
As medidas propostas pelo governo do estado estão na limitação da oferta de água para a região metropolitana, o reuso da água da lavagem dos filtros da Estação de Tratamento de Água Gavião (ETA Gavião), a perfuração de poços na região do Porto do Pecém, a construção de um açude no Rio Maranguapinho e a dessalinização de águas subterrâneas.
O aprimoramento progressivo de técnicas de purificação de água vem possibilitando a implantação de sistemas com alta eficiência para aproveitamento de águas salobras e marinhas. Cerca de 200 sistemas de dessalinização do Programa Água Doce (PAD), do Ministério do Meio Ambiente, foram entregues no Ceará em dezembro de 2016, beneficiando 34 municípios do semiárido cearense e atendendo cerca de 70 mil pessoas. Além da captação da água, tais sistemas são responsáveis também pela filtragem e distribuição, contendo ainda um reservatório específico para o concentrado de sal, que tem destino ecologicamente correto.
Na zona rural de alguns municípios, como Canindé, os moradores pagam valores simbólicos, no caso R$ 0,20 ou R$ 0,50 que dão direito a 20L de água potável. O dinheiro arrecadado, no caso do município de Canindé, serve para pagar o consumo de energia do sistema, que sai por R$ 25,00 em média.
Para o ambientalista José Airton Maciel, a dessalinização das águas pode constituir-se em uma ferramenta concreta de desenvolvimento regional no semiárido do Nordeste brasileiro, entretanto, é necessário que se considerem os riscos ambientais decorrentes do processo. Isso porque o mesmo gera, além da água potável, uma água residuária altamente salina e bastante poluente.
Uma das formas de evitar que tal resíduo danifique o solo é o cultivo da planta Atriplex (planta sal), uma planta forrageira arbustiva, de ambientes áridos e semi-áridos, que se desenvolve bem em solos com alto teor de sal. Devido sua alta capacidade de retirar do solo grandes quantidades de sais, tal planta é uma alternativa ecologicamente equilibrada, acessível ao pequeno produtor e que torna reaproveitável áreas outrora improdutivas. Tal planta pode servir ainda como forragem para caprinos, ovinos e bovinos, na produção de lenha, como planta medicinal e na culinária.
Devido ao alto custo de dessalinizadores (R$ 15 a 40 mil), vários pesquisadores vêm tentando desenvolver formas alternativas de dessalinização da água de forma economicamente acessível. Um dos exemplos é o projeto do professor da Universidade Federal do Ceará, Ronaldo Nascimento, que com o apoio da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) busca desenvolver e avaliar o desempenho de um dessalinizador térmico de baixo custo. Além disso, visa também o tratamento de água salobra de modo a enquadrá-la aos padrões de potabilidade da portaria 2914 do Ministério da Saúde. A pesquisa encontra-se em fase de desenvolvimento, mas segundo o pesquisador, a adequação das instalações e a otimização dos parâmetros operacionais do aparelho para o tratamento da água já foram concluídas.
É importante ressaltar que várias outras pesquisas estão sendo desenvolvidas em todo o estado com o intuito de minimizar os efeitos da seca, todas procurando por resultados satisfatórios para os três pilares, econômico, ambiental e social. Vivemos um momento bastante delicado, por isso é importante ter, acima de tudo, consciência porque “CADA GOTA CONTA” (figura 1).
Figura 1: Propaganda eletrônica do governo do estado no site da Funceme.
REFERÊNCIAS
PORTAL BRASIL. Sistemas de dessalinização beneficiam 70 mil no Ceará. Disponível em:<http://www.brasil.gov.br/meio-ambiente/2016/12/sistemas-de-dessalinizacao-beneficiam-70-mil-no-ceara>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
TVDIÁRIO. Solução para a seca? Professor cearense desenvolve dessalinizador térmico. Disponível em:<http://tvdiario.verdesmares.com.br/noticias/tecnologia-e-games/solucao-para-a-seca-professor-cearense-desenvolve-dessalinizador-termico-1.1525529>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
TRIBUNA DO CEARÁ. Jovem desenvolve dessalinizador artesanal em Quixeramobim. Disponível em:<http://tribunadoceara.uol.com.br/noticias/ceara/jovem-desenvolve-dessalinizador-de-baixo-custo-em-quixeramobim/>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
O POVO. A dessalinização de água do mar no combate à seca. Disponível em:<http://www.opovo.com.br/app/opovo/opiniao/2016/02/02/noticiasjornalopiniao,3570047/a-dessalinizacao-de-agua-do-mar-no-combate-a-seca.shtml>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
DIÁRIO DO NORDESTE. Dessalinizador viabiliza água potável. Disponível em:<http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/regional/dessalinizador-viabiliza-agua-potavel-1.464567>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
DIÁRIO DO NORDESTE. Seca de 2016 no Ceará está entre as piores da história. Disponível em:<http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/regional/online/seca-de-2016-no-ceara-esta-entre-as-piores-da-historia-veja-a-lista-1.1565486>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
EBC AGÊNCIA BRASIL. Maior seca dos últimos 100 anos provoca mudanças no uso da água no Ceará. Disponível em:<http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2016-09/maior-seca-dos-ultimos-100-anos-provoca-mudancas-no-uso-da-agua-no-ceara>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
GLOBO. CE tem 73% do território em estado de seca extrema ou excepcional. Disponível em:<http://g1.globo.com/ceara/noticia/2016/10/ceara-esta-com-7326-em-estado-de-seca-extrema-ou-excepcional.html>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
INSTITUTO AGRONÔMICO DE PERNAMBUCO. Atriplex: uma nova forrageira para solos salinizados do semi-árido nordestino. Disponível em:<http://www.ipa.br/resp11.php>. Acesso em: 10 de jan de 2017.
Fontes das Imagens
Imagem de chamada: Foto de Ueslei Marcelino/Reuters. R7. Disponível em: <http://noticias.r7.com/brasil/nordeste-corre-contra-o-tempo-para-salvar-cidades-assoladas-pela-seca-19022017>. Acesso em: 13 de março de 2017.
Figura 1: Funceme. Disponível em: <http://www.funceme.br>. Acesso em: 13 de março de 2017.